sexta-feira, dezembro 27, 2013

Resultados do Futebol de Resultados

Hoje, dia 27 de dezembro de 2013, o Campeonato Brasileiro ainda não acabou. Já sabemos quem foi o campeão - deeeeesde outubro, convenhamos - e também quem serão os outros 5 brasileiros na Libertadores'14. Também temos uma boa ideia sobre quem estará na Série A... e há, é claro, a situação da Portuguesa de Desportos. Não entrarei em detalhes sobre o assunto, mas o fato é que, apesar de não haver mais jogos a se disputar, ainda não temos os 4 rebaixados para 2014. É, sim, já sabemos quem serão os 4 que subirão, mas e os que cairão? Sem chances. Só o STJD decidirá o resultado disso. O resultado emergirá do tribunal, o mesmo tribunal que disse, em 2010, que o Fluminense era o Campeão, com jogador irregular e tudo, e que o resultado construído em campo não poderia ser revertido fora dele. Passaram-se 3 anos e o mesmo Fluminense, aparentemente, terá o resultado construído em campo revertido em seu benefício, evitando o rebaixamento. O resultado disso é que, mais uma vez, mostra-se que há sim vários pesos para a mesmíssima medida no nosso futebol.

Mas eu não quero falar da manchinha preta no terno branco.

Eu quero, primeiramente, agradecer pelo ano de 2013, que foi o melhor ano da minha vida. Tanto mais por ter visto o meu querido Cruzeiro campeão brasileiro - conquistando o sétimo título nacional - e por ver o Atlético-MG campeão da Libertadores. Não, não me dói reconhecer méritos do adversário, simplesmente porque a rivalidade entre Raposa e Galo é estritamente estadual: Cruzeiro e Atlético-MG nunca decidiram nada no Mundial, por razões óbvias. Também nunca se enfrentaram pela Libertadores da América, em todos esses 50 e tantos anos de competição. Na Copa do Brasil, mesmo o Cruzeiro possuindo 4 títulos e o Atlético-MG tendo participado de todas as edições - exceto a de 2013 - eles também nunca se viram. No Brasileirão há apenas 1 jogo que valeu alguma coisa em todas essas décadas: aquele que o Cruzeiro ganhou por 6 a 1 do Atlético-MG e evitou o rebaixamento. E é só. Nem pela Sul-Minas, nem pela Copa Centro-Oeste, nem na época de Supercopa e Conmebol, nem na Recopa... Cruzeiro e Atlético-MG só se dobram no estadual. E, como na minha opinião a rivalidade é exercida fundamentalmente DENTRO DE CAMPO, não há razão para dizer nada a respeito do que o Atlético-MG faça além do âmbito regional... até porque, sejamos francos, ele nunca faz muita coisa, de bom ou de ruim. E a Libertadores de 2013 é a exceção que comprova a regra.

Porém, é normal que se estranhe um cruzeirense dizer que "ficou feliz" com o resultado positivo do rival estadual. Em princípio, é realmente um pouco estranho. Mas quando digo isso estou dizendo com olhos no futuro: o resultado deles em 2013 implica em um possível - e inédito - embate entre Cruzeiro e Atlético-MG na Libertadores em 2014. Não é certeza, não está garantido, mas pode ser que ocorra! E, a partir daí, após tantas décadas, Cruzeiro e Atlético-MG serão rivais em algo mais que o estadual, o que seria um ótimo desdobramento para o futebol mineiro, qualquer que seja o resultado do eventual confronto. Ganham todos, com uma rivalidade levada a um aspecto internacional, ou quem sabe nacional... caso os dois times voltem a brigar pelas primeiras posições em 2014 também no Brasileirão.

Esse distanciamento, essa posição (quase) neutra diante do resultado deles não é algo fácil de se manter. Primeiramente, porque tenho dois irmãos, ambos atleticanos, com (contra?) quem sempre discuto sobre futebol, o que nunca termina bem. Meus pais, que já cresceram o suficiente para perceber a tolice que é discutir como discutimos, ainda nos chamam a atenção, dizendo para "pararmos com esse fanatismo". Creio que em muitos outros lares seja assim. Não creio ser um fanático, mas o resultado é que monopolizamos a ceia de Natal, a mesa do churrasco, a frente da geladeira, o intervalo comercial do filme, sempre aos berros, sem realmente ouvir o que o outro está dizendo. Vergonhoso. Ainda mais para mim, já que eles são dois... provavelmente eu grito o dobro. Mas, de resto, tento sim entender que o futebol de paixões já acabou faz tempo... hoje, temos apenas o futebol de resultados. Resultados financeiros, para que fique bem claro. Nunca me esquecerei da charge sobre a final da Libertadores 2009, quando o Cruzeiro perdeu para o Estudiantes... perante uma renda de R$2.000.000,00 (não, não importa mais o público). A charge, então, mostrava um repórter fazendo uma pergunta ao então Presidente do Cruzeiro, e este, de costas ao repórter, abraçado a um saco de dinheiro do tamanho de um mamute, todo cheio de amores. E feliz.

Então, hoje, quando vejo um time como o Cruzeiro ganhar o Brasileirão jogando o bom futebol, ao passo em que o Fluminense se escora em resultados financeiros e favorecimentos variados para permanecer na Série A, eu vejo que as rivalidades são bem outras. Não me importo mesmo com o que o Atlético-MG ganhe ou deixe de ganhar, perca ou deixe de perder. A exceção, óbvia, é quando essas derrotas ou conquistas afetarem o meu time do coração, o que nunca aconteceu fora do Campeonato Mineiro, afora 3 ou 4 exceções, ou quando as coisas começarem a se decidir FORA DO CAMPO.

Também não me apego, não crio vínculo afetivo (de amor ou de ódio, ou do que quer que seja) com esse ou aquele jogador, treinador, presidente de clube ou torcida organizada, porque essas pessoas, todas elas, não estão atrás de resultados esportivos, e sim de resultados financeiros. Exceções existem, e portanto são tratadas como tal. Como não virar fã de jogadores como Sorín e Fábio, só para citar dois, que criaram um vínculo mais que profissional com o Cruzeiro, a ponto de serem admirados até pelos rivais? Como esbravejar contra o Cuca ou quem quer que seja, por ter ido embora pelo dinheiro que foi? São, todos os três, pessoas que vieram, viram e venceram. Entregaram o resultado mais que esperado, e que merecem o respeito de todos. Profissionais do futebol de resultados, que é o único futebol em que eles puderam trabalhar.

E,

segunda-feira, novembro 11, 2013

... Campeão?

O Cruzeiro venceu o Grêmio ontem, pela trigésima terceira rodada do Campeonato Brasileiro de 2013. Com isso, chegou a 71 pontos, que costuma ser o número mágico para quem quer ser o campeão do torneio. O segundo colocado, o Atlético-PR, tem... 58 pontos, nos mesmos 33 jogos disputados. São 13 pontos de diferença, a 5 rodadas do fim. O resultado dessa vantagem é que o Cruzeiro nem precisa mais jogar: para se sagrar o campeão, só precisa que o Atlético-PR deixe de ganhar uma única vez, pois nesse caso o time do Paraná só chegaria a 71 pontos. Nem vou comentar sobre o abismo que separa os dois times no quesito saldo de gols e no número de gols pró. No número de vitórias, o Cruzeiro nem pode mais ser alcançado (22 a 16, a 5 rodadas do fim).

Então, o Cruzeiro já é o campeão?

Prefiro não responder agora, porque há muito mais o que se dizer sobre esse campeonato brasileiro de 2013. No último texto, falei sobre as disparidades, os absurdos e o avesso que é esse campeonato brasileiro de 2013. Hoje, gostaria de chamar a atenção para algumas outras coisas.

A primeira coisa que quero destacar é o fato de o Cruzeiro ter vencido todos os outros participantes do torneio, o que é inédito na história da competição. Pensem bem se é fácil vencer 19 adversários, e vocês todos perceberão a grandeza do feito. Para mim, já vale algum tipo de troféu, de exemplo, de placa e de homenagem.

A segunda coisa é a maneira como o time jogou a competição. O futebol apresentado pelo Cruzeiro é um bom resgate de algo há muito perdido nesse país: o direito de se jogar bonito, com toque de bola, sem correria e chutão, e ainda aspirar ao título. O Grêmio entrou com três zagueiros e três volantes ontem, o jogo foi truncado, e no final: 3 a 0 para o Cruzeiro. Jogou mal o Grêmio? Não, não jogou, mas não veio aqui para ganhar a partida. O Cruzeiro, em todos (?) os jogos do Campeonato, jogou para ganhar. E, noves fora aquelas feiosidades que todo o mundo faz hoje em dia (como aquela esparrela de se prender a bola na cobrança de escanteio, a minutos do fim da partida), obteve seus pontos jogando o seu futebol, com a sua tradição e da maneira que sempre fez em todos os títulos do passado: toque de bola, dribles objetivos e finalizações das mais precisas.

Terceira coisa: muita gente ainda pensa que a grandeza de um clube é medida por seus títulos, por sua galeria de troféus e medalhas. Eu não penso assim. A grandeza de um time está em sua matriz, seu estilo de jogo, suas tradições e seus craques históricos. De 1990 para cá, o Cruzeiro venceu muitas competições, mas não foram os troféus que ficaram: foram as tradições do clube, foi o reconhecimento nacional e internacional de que existe "um certo" time azul-celeste em uma cidade do interior do Brasil que joga com seu estilo próprio. Que entra na Libertadores, e é respeitado. Que vai em excursão, e mostra sua identidade. Que joga aqui, joga ali, seja um amistoso, seja um especial para encerramento de carreira de jogador, e sempre traz consigo a marca do toque de bola, da velocidade, da habilidade e dos atacantes astutos, astutos como a Raposa que lhe serve de mascote.

Em 1976, Joãozinho foi mais astuto que todos. Em algum lugar, Deus gargalhou, e o Diabo sentiu uma pontinha de inveja.

Em 1994, Ronaldinho foi mais astuto que Rodolfo Rodrigues.

Em 1996, Marcelo Ramos foi mais astuto que o goleiro, os zagueiros, o narrador, o comentarista...

Em 2000, Geovanni, auxiliado por Miller, foi muito astuto. Rogério Ceni se recorda.

No mesmo 2000, o goleiro André foi mais astuto que seus colegas de time, e que boa parte da torcida.

Em 2003, sobrou astúcia, para todos.

E, em 2013, astuto foi Marcelo Oliveira, que sempre conheceu e reconheceu a grandeza de um adversário histórico, e soube respeitá-la, não inventar, e dar à torcida e à competição um Cruzeiro xerocado dos idos de 2000, de 1990, de 1980...

O futebol brasileiro (o BOM futebol brasileiro) tomou um duro golpe em 1982, quando jogou tão bem e se saiu tão mal naquela Copa do Mundo. Para piorar, em 1994, um time de brucutus sagrou-se campeão mundial. Nós aqui, desde então, começamos a ver uma produção em série de "um certo tipo de jogador", um cara que fica ali, perambulando pelo meio de campo, sem muito propósito nem muita lucidez, apenas esperando a hora de matar (sim, MATAR) um lance do adversário. Desde então, todo o mundo tem 2 ou 3 desses caras em campo, e é esse genocídio no nosso futebol... e aí, quem se atreve a criar algo em um ambiente desses? Alguns se atrevem... atualmente, há "um tal" de Ronaldinho Gaúcho, mais uns e outros, que trazem consigo mais que a vontade de ganhar rios de dinheiro, que fazem as jogadas parecerem fáceis... talvez eles não se deem conta, mas o fato é que eles inspiram, eles fazem com que os próprios adversários queiram ver mais... queiram ser mais... queiram jogar mais. Em 2003, eu vi uns e outros adversários parados em campo, vendo o Alex jogar pelo Cruzeiro. Não raro, ainda vejo o mesmo atualmente, quando o Ronaldinho Gaúcho põe o pé na bola. É sempre rápido, sempre apenas um lampejo, mas aquela admiração está ali, está sempre ali, não pela figura do craque em si, mas sim do bom futebol prestes a se manifestar. Para que fique fácil de se observar, veja o comportamento desses jogadores, que formam uma barreira, durante a cobrança de falta de "um certo" Zico, láááá em 1987...


... se você reparar bem, apenas um deles salta durante a cobrança, e todos os outros (cinco?) viram-se para acompanhar a trajetória da bola. Eles não querem saber que é semifinal de campeonato, se é jogada do adversário ou o quê. Eles querem ver o bom futebol, e eles estão no melhor assento possível: dentro do campo. Quando a bola que eles acompanham, hipnotizados, finalmente entra, alguns põem as mãos na cintura, em um gesto que parece dizer "como é que ele consegue?", ou "putz, o goleiro nem teve chance". Esse mesmo gesto, esse mesmo grupinho decepcionado, também é visto em um gol de Éverton Ribeiro, contra o Santos, que ficou 1 a 0 para o Cruzeiro. Repare ao final do vídeo, os 4 defensores, cabisbaixos, de mãos na cintura, sem nem ter muito para onde olhar:


É esse o mais importante feito do Cruzeiro em 2013, o de ser um time que joga o futebol que todos deveriam jogar: um futebol agudo, objetivo, lúcido e direcionado para a construção das próprias vitórias, e não para a destruição das jogadas do adversário. O São Paulo foi tricampeão brasileiro, o primeiro autêntico tricampeão brasileiro, há menos de 5 anos... e ninguém se lembra daquele time, justamente porque era um time de brucutus, de retranca, de gente interessada em matar (MATAR) as jogadas adversárias, de ganhar sempre de 1 a 0, sempre abusando do anti-jogo, das faltas, enfim, fugindo do bom futebol. Entrou para a história, mas não inspira em nada. Agora, o Cruzeiro ou o Santos de 2003... o São Paulo ou o Palmeiras de 1993... o Flamengo ou o Atlético-MG de 1980... o Inter ou o Cruzeiro de 1975... o Santos ou o Botafogo de 1961... tantos outros, com ou sem títulos, foram times que inspiraram, e ainda inspiram, as melhores escolas de futebol do país. E que deram identidade às suas equipes, além de craques, hinos e padrões de excelência das diferentes escolas de futebol do Brasil.

Do país do melhor bom futebol que existe.

E.

sábado, novembro 02, 2013

Tão Perto do Título, Tão Distante da Realidade

Nessa semana que se iniciará amanhã, o Cruzeiro viverá a expectativa da conquista do título de Campeão Brasileiro de 2013. Dez anos depois, um time fora do eixo Rio-SP poderá ganhar o campeonato nacional... como fez o próprio Cruzeiro, em 2003.

No ano de 2003, o Cruzeiro ganhou tudo o que disputou: Brasileiro, Copa do Brasil e Campeonato Mineiro. Como foi a primeira vez que isso aconteceu aqui no Brasil, deu-se o nome de Tríplice Coroa ao feito, um nome que já era utilizado no futebol europeu para um time que tivesse desempenho similar (eles não tem campeonatos estaduais, como nós aqui temos, então os títulos de lá são o Campeonato Nacional e os dois torneios continentais, Copa da UEFA e Copa dos Campeões da Europa). Desde então, ninguém mais conseguiu repetir o feito do Cruzeiro, apesar de alguns times daqui terem ganho 3 títulos no mesmo ano (se não me engano, o Internacional o fez em 2006, por exemplo).

Em 2013, se ganhar o Campeonato Brasileiro, o Cruzeiro superará todas as expectativas com relação ao seu desempenho para a temporada, inclusive as suas próprias. Foi um time montado muito às pressas, com um treinador de ótimo nível, mas sem muito tempo para entrosar a equipe. Além do curtíssimo tempo para se preparar para a competição, o Cruzeiro tinha contra si mesmo o recente período de "crise", onde o time não ganhou nada (novamente, desde 2003) e vinha perdendo espaço para o Atlético-MG. Para piorar ainda, os rivais ganharam a Taça Libertadores em 2013, maior conquista da história do clube alvinegro. Não, não parecia um bom ano para nós, cruzeirenses, ou para o nosso time.

Porém, alguns fatores decisivos entraram em campo em 2013.

O maior e mais evidente fator, na minha opinião, foi a queda de qualidade de todo o futebol jogado na América do Sul. Não, o Cruzeiro não disputou a Libertadores em 2013, assim como não o fizeram vários times tradicionalíssimos na competição. O São Paulo, tão grandioso em Libertadores, foi um coadjuvante limitado. O Fluminense, Campeão Brasileiro de 2012, foi menos ainda - e segue na rabeira do campeonato nacional desse ano. O Corinthians, campeão da Libertadores do ano passado, parece que nem participou! O torneio foi fraco, mais fraco que a média. Ainda assim, coroou um campeão tão digno quanto qualquer outro campeão, um time que jogou com muita raça, muito toque de bola, muito apoio da torcida e que também contou com muita sorte. E todo campeão de Libertadores tem que ter sorte, vide 1997:



... vide 2004:


... ou vide 2002:


Em termos de nível técnico, o mesmo fiasco presenciado na Libertadores pode ser presenciado no Brasileirão desse ano. Palmeiras, rebaixado no ano passado e atualmente disputando a Segundona, é o melhor destaque do futebol paulista... do carioca, fala-se menos ainda. Nenhum dos dois produziu nada digno de nota, exceto um Botafogo sem muita vocação para o título, ou mesmo para o vice-campeonato. Se o Cruzeiro ganhar o título, terá vencido um campeonato também fraco, mais fraco que a média, ainda que de maneira digna e com todos os méritos, tanto quanto qualquer outro campeão etc etc etc.

Mas, como explicar? Como pode um campeonato nacional, onde estão os atuais campeões do mundo, da libertadores e da mercosul, não ser admirável? É difícil de se entender - não que eu não esteja achando o máximo! - um Brasileirão de 20 clubes, onde 6 das últimas 10 posições pertencem a clubes do eixo Rio-SP, onde não há paulista no G4 e com o atual campeão na porta da zona da degola. É como se, de repente, os times do Paraná, da Bahia, de Santa Catarina e Goiás acordassem para a competição, para as vitórias, mas sem o brilho de um futebol bem jogado. Vale mais raça e vontade que consistência e qualidade.

O Cruzeiro destacou-se, sim, por um bom futebol nesse longo campeonato... porém, praticamente não teve adversário nesse quesito, perdeu o estadual (não teve ressaca de título) e foi logo eliminado da Copa do Brasil (não teve que dividir o foco), então lutou pelo que restou, e vem acertando. O próprio Atlético-MG, se tivesse curtido menos a sua ressaca pós-Libertadores, seria também um candidato ao título tão digno quanto, e aí sim ficaria IMPOSSÍVEL aguentar os atleticanos... para o "azar" deles, todo o mundo ficou muito feliz com a conquista da Libertadores, deixando o Brasileirão de lado.

Mas e todos os outros? Como explicar?

Não creio realmente que haja uma explicação para tanto desprezo, despreparo e desinteresse com relação ao Brasileirão... é como se a realidade fosse outra, como se a Copa do Mundo já estivesse acontecendo dentro de muitos dos clubes, como se os interesses fossem já beeem distantes não apenas desse campeonato, mas também de todo o calendário do futebol de 2013.

Tanto melhor para o Atlético-MG e para o Cruzeiro que, atentos às suas respectivas realidades, tão distantes da norma de cada um, souberam aproveitar-se da distração dos outros e marcar lugares muito dignos. Para ambos. Com ou sem título.

E.

sexta-feira, setembro 13, 2013

Uma Cidade Carente de Babás


Há mais ou menos um ano atrás, o Prefeito Márcio Lacerda deu essa entrevista, comentando as inundações do então mês de novembro de 2012 em BH. Causou aquele furorzinho de nada em muita gente. Aquela raivinha besta, de quem dá um soco na mesa ou no braço da poltrona, e então acompanha caladinho à previsão do tempo ou aos gols da rodada, ou o que quer que venha logo em seguida. Gente que certamente votou nesse cara, e então o reelegeu.

Hoje, porém, andando pelo centro de BH, vivi algumas situações que dão ao Prefeito Márcio Lacerda alguma razão em dizer o que disse (ou seja, ele fez a afirmativa certa no contexto errado). Muita gente em BH necessita de babás.

Fui comprar ingressos para o jogo do Cruzeiro contra o Atlético-PR, no Mineirão. Como levarei uma amiga ao estádio, e será a sua primeira vez, pensei em comprar ingressos das arquibancadas centrais, o setor vermelho ou o setor roxo, no anel superior, pois não há melhor lugar para se ver a partida. A entrada mais barata? Cem reais. Sim, duzentos reais para duas pessoas assistirem a uma partida de futebol, mais custos de alimentação, água, transporte, etc. Bom, em se tratando de ocasião especial, decidi que valia a pena... até chegar ao guichê e ser informado de que não poderia escolher a posição das poltronas. Hein, como assim? A atendente explicou: as entradas são vendidas aleatoriamente para cada setor. Argumentei que o estádio era todo numerado, separado por setores, fileiras e cadeiras, e que não fazia sentido eu não poder escolher a posição das cadeiras de acordo com a disponibilidade. Daí, ela me disse o seguinte: Tanto faz a cadeira que você compra, pois ninguém está obedecendo à numeração delas. Emudeci diante de uma afirmação tão tácita vinda de uma pessoa que trabalha vendendo ingressos na sede do Cruzeiro, que aceita e corrobora a falta de respeito das pessoas que não estão nem aí para a posição do seu assento demarcado, e se dão ao direito de ir sentar nas cadeiras dos outros. Não quis saber dos cambistas posicionados a 6 metros das bilheterias, ali mesmo, ou da animada conversa dos seguranças engravatados com esses mesmos cambistas, mas ouvir com todas as letras o descaso e a omissão diante de um mau feito me deixou desarmado. Resumo da ópera: o torcedor brasileiro precisa de babás, para entender que não pode se sentar onde não pagou. Babás que o guiem até seu assento, que os acompanhem durante toda a partida - inclusive no intervalo -, que os levem ao banheiro, que os indiquem como se comportar nas filas, como não comprar ingressos de cambistas, etc etc etc. Porque, por si só, não dão conta. O próprio clube, nesse caso, acusou o golpe e aceitou o mau feito: oras, se os próprios torcedores não respeitam as numerações, por que é que eu vou me dar ao trabalho de vender ingressos realmente numerados? Põe uma geradora de números aleatórios, vendem-se os bilhetes, e o sujeito que se vire lá com quem estiver em seu assento. Que beleza!

Pouco antes de comprar os ingressos (que acabei levando em um outro setor), estava atravessando a Avenida Augusto de Lima e, mais ou menos no meio do caminho, o sinal mudou de verde para aquele vermelho intermitente. Imediatamente, um dos carros parados emitiu aquele característico ronco de motor que todo pedestre astuto conhece como sendo o código internacional para "apresse-se, senão eu passo por cima de você", e então põe-se a trotar, correr, manquitolar, enfim, a se mover mais rapidamente sobre a dita faixa, em direção ao canteiro. É claro que, assim que você passa, a pessoa que controla o dito automóvel acelera mais ainda, e sai cantando pneus, tirando casquinha de você. Pois bem, dessa vez, não acelerei o passo. Continuei caminhando no meu ritmo, nem devagar e nem apressado e, só para garantir que a mensagem tinha sido recebida, direcionei à pessoa no assento do condutor daquele veículo o mesmo olhar que direciono aos meus alunos quando fazem bagunça demais.

O carro morreu.

Mentira, não morreu, mas o ronco do motor diminuiu para quase zero. Não sei com o quê a pessoa atrás do volante se parecia, se era homem ou mulher, pois o vidro era demasiado escuro para se enxergar. Gosto de imaginar, contudo, que a pessoa fez aquela cara de "foi mal, me desculpe". Atravessei a faixa, cheguei à calçada e, só então, aquele carro e um outro ao seu lado seguiram seu caminho.

Estou para ver outra coisa que transforme uma pessoa tão rapidamente em um neandertal quanto o ato de dirigir. É como se o sujeito estivesse não dentro de um automóvel, mas sim de uma cápsula de direitos e privilégios aprimorados. É incrível: não há uma relação dentro do trânsito que não seja pura e simples competição. O sujeito recebeu a preferência? Lá vem o buzinaço, pura inveja destilada... por quê ele, por que não eu? É como se um direito tivesse sido retirado de várias pessoas, para atender apenas a uma delas. O sujeito quer trocar de faixa, dá seta, faz tudo certo... mas quem é que lhe dá espaço? Ninguém. E, se alguém oferece esse espaço... lá vem buzina. Como assim, você deixou esse cara passar na nossa frente? Eu estou perdendo aqui atrás! É como uma criança mimada, que não queria um doce até saber que era o sabor favorito do coleguinha ao lado. Não importa se o trânsito está parado, se está tudo enroscado, se há 3 ou 4 policiais tentando organizar aquela coisa toda, o sujeito não dá a preferência por nada! Para ninguém! Tá na ambulância, de sirene ligada? Morre, meu filho... mas morre aí atrás, porque aqui você não passa! E os pedestres, novamente: começou a piscar o sinal, começam a correr na faixa. Não, não importa que o cruzamento esteja fechado, que o guarda de trânsito ainda não tenha feito o sinal para que os motoristas deem a largada, o que importa é que os caras já estão acelerando e pondo os motores para roncar alto, portanto "apresse-se, senão eu passo por cima de você". Minha nossa, quantas babás são necessárias! Uma para cada motorista, pelo menos... mais umas tantas para os pedestres... eu diria uma babá para cada dois pedestres. Mais os motociclistas, que hoje proporcionaram uma visão inédita: enquanto vinha um guarda municipal em sua moto/viatura, de sirene ligada e tudo o mais, contornando os carros, lá vinham atrás dele seis ou sete motociclistas, civis, de viseira levantada nos capacetes, seguindo por um caminho aberto por um veículo oficial, tal e qual as pessoas fazem quando uma ambulância passa com a sirene ligada. Vão no vácuo. Aceleram suas vidas sobre a morte dos outros. Mas, com motos? Inédito! Inevitável lembrar-me das patas que vão à frente, com uma fileira de 5 ou 6 filhotes a lhes seguir, em fila, comportados... haja babá!

E.

sábado, agosto 24, 2013

Cavalo e Maçãs

Um pequeno cavalo entrou em um pomar, sem selas, sem intenção alguma. Apenas entrou. Porteira aberta, reentrância na cerca do curral, e foi-se. Para ele, em seu breve trote de um ponto a outro, não sabia realmente se estava entrando em um lugar ou apenas saindo de onde estava: apenas moveu-se.

Além do pomar, um muro. Não havia horizonte a se buscar, e portanto restou ao pequeno cavalo apenas olhar ao redor, encurtar o olhar. Cavalos não são bons em enxergar coisas que estão muito próximas deles mesmos. Seus olhos sempre buscam o horizonte, o longe, detrás das serras e morros. Eles veem um buraco 500 metros à frente, mas não veem uma cobra um metro adiante. Portanto, estar em um pomar não dizia nada de nada, pois o pequeno cavalo não o via adequadamente.

Aquilo incomodou. Quis saber onde estava.

Saiu, passou novamente pelo curral, atravessou outra cancela aberta - que povo relapso! - subiu um morro, e olhou para trás. Dali, ele viu o pomar, o curral, a casinha e o açude. Tudo muito bonito e bem cuidado: jardins, calçadas, hortas e... o pomar. Que belo pomar! Com tantas maçãs, maduras! Prontas para a colheita, para os doces, os passeios dali até à cidade, as idas e vindas, as visitas, os surrupios dos garotos e as brincadeiras das meninas. E tão lindo pomar, já no fim do barranco - ah, então não era um muro, era a parede de um barranco - todo cercado e sombreando aquele lado da casa.

A distância o incomodou. Quis voltar para onde estava.

E, descendo, pisando aqui e ali, desviando daquilo que sabia, de memória, ser o pior caminho, voltou ao curral. Entrou, mas antes que pudesse retornar ao pomar, uma lufada de vento empurrou a cancela, que bloqueou seu caminho, fechando a entrada para o pomar. Não poderia mais retornar. E o vento encorpava, sacudindo tudo que ele não via. Ali, naquele fundo de barranco, o vento fazia das suas, curvando, assoviando, subindo, afastando e fechando as copas das árvores, a crina no pequeno cavalo, as janelas da casinha. Tudo sem muito ritmo, mas muita persistência. O pequeno cavalo animou-se com o assovio do vento em seus cascos, e imaginou-se a correr e rodopiar entre os morros, longe, observando o pomar e todo o resto. E relinchou, feliz, dentro do curral.

Quando o vento arrefeceu, o pequeno cavalo deliciou-se com o cheiro forte de maçãs recém-caídas das árvores. Maçãs que ele não via, mas que se lembrava, de quando estava longe, como eram belas, brilhantes, sedutoras...

E.